Dr. Cláudio de Souza Leite - Médico
Membro da Sociedade Brasileira de Alcoologia
Jovens envolvidos com drogas e álcool chegam ao "fundo do poço" precocemente.
Alcoolismo é uma doença progressiva que desmoraliza antes de levar à morte e atinge 13% da população. Podemos estimar em 20 milhões o número de alcoólicos no Brasil.
Beber abusivamente é a principal causa de problemas na vida atual: acidentes, traumas, violência familiar e urbana, mau desempenho escolar e doenças causadas pelo álcool (diabetes, cirrose, hipertensão arterial, câncer de boca, larin-ge, esôfago e pulmão etc.) são responsáveis por 30% das internações em hospitais gerais e 50% em hospitais psiquiátricos.
A doença do alcoolismo é o principal problema de saúde pública atualmente. Em todos os países que culturalmente usam bebidas alcoólicas são raras as pessoas que não entraram em contato com o álcool ainda crianças. O álcool é considerado pela sociedade como inofensivo e até saudável. Todo brinde de saúde é feito com álcool champanhe, vinho e cachaça. O álcool está culturalmente ligado ao sucesso, à beleza e à saúde. No seio familiar ninguém se preocupa com um filho ou filha de 12 a 14 anos que chega em casa de pilequinho. O nome pilequinho já procura minimizar o problema.
O hábito de beber entre os jovens é cada vez mais precoce e difundido. O jovem bebe para se desinibir e participar dos seus grupos. Beber tomou-se hábito freqüente nos últimos 20 anos. É fácil avaliar, pois basta compararmos neste período o crescimento da produção de cerveja, de vinho e de cachaça. Além da liberdade do uso de bebida alcoólica com plena aceitação dos pais, o jovem é estimulado por uma agressiva publicidade na mídia. Os melhores anúncios da televisão são relacionados ao sucesso, à beleza e à juventude de quem bebe. Desencadeada sistematicamente, a maciça propaganda é um dos fatores responsáveis pelo crescimento descontrolado do uso da bebida alcoólica.
Não beber fará do jovem um “careta”, porque o efeito do álcool sobre o cérebro, de imediato, causa euforia, desinibição e coragem, dando uma falsa idéia de liberdade. Inserido em seu grupo, o jovem necessita atuar com desembaraço e desinibição e o álcool é perfeito para criar estas condições. O convívio em turmas faz parte da iniciação do jovem. Nelas, eles têm hábitos semelhantes e fazem sempre as mesmas coisas, inclusive beber. Concomitantemente, começa a ocorrer neste jovem uma mudança hormonal que provoca alterações no corpo, voz e comportamento. Este aumento hormonal na puberdade intensifica a necessidade de liberdade geral, de viver intensamente, aproveitar tudo ao máximo. Temos que considerar que este jovem nem sempre vem de um lar e de família estruturados, o que acentua sua necessidade de libertação da casa dos pais.
O uso de drogas associadas.
O álcool atua como depressor do cérebro com o uso continuado provocando sono. E a sonolência impede o prazer e a euforia da primeira fase de sua ação. Para usar o jargão próprio dos jovens, o uso continuado do álcool “corta o barato”. A participação na festa ou no cotidiano dos bares fica prejudicada. Este é o momento em que entra em ação a necessidade de usar drogas estimulantes, como a cocaína e o ecstasy (droga à base de anfetamina). O uso concomitante destas duas drogas (álcool e cocaína) permite a prolongação do prazer e euforia iniciais, porque, sendo antagônicas, uma neutraliza a outra. O usuário permanece acordado e com disposição de participar ativamente da “balada”. Continua curtindo o “barato”. Esta associação é usada com freqüência nas festas raves. O usuário pode ficar dias fazendo uso contínuo de bebida alcoólica com cocaína sem dormir e com a falsa ilusão de extrema felicidade. Esquece, porém, que está usando as duas drogas em quantidade crescentes, que podem levar à dependência química em pouco tempo.
É fácil entender porque os casos de overdose ocorrem com freqüência e com conseqüências que vão desde a hospitalização causada por problemas cardiorrespiratórios até à morte. A perda total do controle agravado pelo uso das duas drogas não dá a menor chance ao usuário de decidir o que é o melhor para ele. O cérebro está totalmente entregue aos cuidados do álcool e do pó, com a perda do domínio da vida. Nesta fase do envolvimento com as drogas surgem outros fatores de risco. Ao acrescentar a droga ilícita (cocaína ou ecstasy), o usuário de álcool corre riscos maiores e sofre mais conseqüências como o aumento considerável da despesa com o programa. Afinal a necessidade de obter a droga ilícita provocará seu envolvimento com traficantes, levando-o a subir morros para chegar às bocas de fumo. O consumo aumentado progressivamente faz o usuário chegar mais cedo à derrota para as drogas com total destruição da espiritualidade.
Acelerando o processo da dependência química
O consumo associado de álcool com a cocaína diminui o tempo de entrada na dependência, aumentando a compulsão e a tolerância, caminho certo para a dependência química. A destruição física, mental e social é total o que leva o usuário a precisar de ajuda urgente. Passa a ser a única opção, pois a alternativa é a morte. Sua vida e de seus familiares vira um terror sem precedentes. Jovens com 16/18 anos começam a ingressar com freqüência em grupos de ajuda mútua Alcoólicos Anônimos (A.A.) e Narcóticos Anônimos (N.A.).
É difícil saber qual a droga principal. Sabe-se, entretanto, que a dependência ao álcool é mais difícil de ser controlada. Isto ocorre por ser o álcool uma droga lícita aceita e usada há séculos.
Nossa herança genética ao álcool é bem mai antiga.
Conclusão: O aumento de jovens procurando ajuda A.A. é um fato indiscutível. O alcoólico típico do passado, com mais de 50 anos e dependente apenas do álcool, é cada vez mais raro buscando ajuda nos grupo de A.A. A aceleração do processo de dependência está associada ao uso de uma droga depressora com outra estimulante.
Esta associação aumenta o número de jovens com 18 ou 20 anos já com problemas sérios de saúde física e comportamental que necessitam de tratamento imediato.
Um dependente químico jamais conseguirá controlar sozinho a sua compulsão pela droga. As clínicas para dependentes químicos desempenham papel importante na fase inicial da recuperação. Para a manutenção da recuperação, entretanto, é fundamental que seja feita em grupos de ajuda mútua que utilizam o Programa dos Doze Passos.
Alcoólicos Anônimos é uma Irmandade de ajuda mútua com 75 anos de experiência, presente nas principais Cidades de 181 países. Os melhores resultados de recuperação prolongada são obtidos em grupos de A.A.
Narcóticos Anônimos é uma outra Irmandade que surgiu a partir do programa e exemplo de A.A.. É bem mais recente, mas já conta com resultados excepcionais. Não podemos subestimar o uso de drogas pelos Jovens.
Ninguém pode decidir se um jovem vai usar droga ou não. Durante sua formação certamente vai surgir um momento em que lhe será oferecida uma droga. E não devemos esquecer que o álcool é uma droga.
O que fazer, então?
A única atitude possível é ele estar informado sobre a ação das drogas e suas conseqüências. E forçar a decisão o mais rápido possível é melhor, pois a informação lhe chegará a tempo de obter os melhores resultados no processo de recuperação. Infelizmente, esta informação ainda não faz parte do contexto educacional brasileiro.
Fonte: Revista Vivência nº 109
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